HANSENÍASE


Definição

Doença neurodermatológica, não hereditária, infecciosa e altamente contagiosa de evolução crônica,   típica de países subdesenvolvidos, sendo que na Europa e em alguns países desenvolvidos a doença esta erradicada.  A evolução da doença depende da imunidade celular específica, contra o bacilo de Hansen. É uma doença que tem sua evolução lenta e insidiosa, a primeira manifestação clínica é uma mancha mais clara que a pele ou avermelhada, que evolui até chegar a uma perda progressiva da sensibilidade dolorosa e tátil. 

A Hanseníase não mata, mas se não for tratada, causa incapacidade e deformações físicas, que comprometem a qualidade de vida do portador.  O Brasil é o único país das Américas, que ainda consta entre os que têm maior carga de Hanseníase no mundo.

Para os especialistas, alguns fatores contribuem para a negligência de alguns setores  no combate à Hanseníase pelo governo:

·         Não tem visibilidade na mídia.

·         Acomete uma camada da população economicamente menos ativa.

·         Ocorre mais em regiões interioranas, onde a população passa fome ou tem uma sub-alimentação e/ou as condições sanitárias são péssimas ou não simplesmente não existem.

·         Não ocorre em surtos que podem ser fatais e assustam a população.

Sinonímia

É uma doença também conhecida pelos seguintes nomes:

·         Leontíase.

·         Lepra (atualmente este termo está sendo substituído por hanseníase).

·         Mal de Hansen.

·         Mal-da pele.

·         Mal-de-Lázaro.

·         Mal-do-sangue.

·         Morféia.

Histórico

O bacilo de Hansen foi descoberto nas esões cutâneas, por Gerhardt Henrik Armauer Hansen, em 1868, em Bergen, na Noruega. É considerada historicamente uma das doenças mais antigas do homem datando de 1400 AC, sendo chamada antigamente de lepra que significa escamoso em grego. Quase  todas as doenças de pele que deixavam marcas profundas na pele antigamente eram chamadas de lepra. Atualmente é reconhecida oficialmente pelo nome de Hanseníase. No Brasil, a Lei Federal nº 9.010/95 oficializa o termo da doença Lepra para Hanseníase.

Incidência

·         Tem maior incidência na África, depois Ásia, sendo que no Continente Americano, o Brasil é o país com o maior número de casos. 

·         A maioria dos casos ocorre entre pessoas de baixa renda e de baixa escolaridade. 

·         Ocorre mais em homens do que em mulheres.

·         Cerca de 80%  da população mundial,  tem uma resistência natural à doença, segundo a OMS. 

·         Os casos ocorrem em média entre os 30 e 40 anos de idade.

·         O limite normal, considerado pela OMS para a hanseníase é de um caso em cada dez mil pessoas saudáveis. .

Agente etiológico

Mycobacterium leprae ou Bacilo de Hansen; família Mycobateriaceae; ordem Actinomycetales; classe Schizomycetes; bacilo álcool-ácido-resistente; parasita intracelular obrigatório.  

Fonte de infecção

O homem, quando é portador das formas clínicas Virchowiana e Dimmorfa, pois, somente essas formas são transmissíveis. O bacilo é transmissível pela respiração. O doente deve ser tratado para eliminar a fonte de infecção.

Reservatório

O homem.

Período de incubação

É uma doença com um período de incubação longo em média de 3  a 6 anos. Há referência a períodos mais curtos (7 meses) como também de período mais longo (10 anos). Nesse período há um grande risco de transmissão para outras pessoas.

Período de transmissibilidade

A transmissibilidade é alta enquanto persistir a presença dos bacilos em indivíduos não tratados, sempre nas formas Virchowiana e Dimorfa.

Via de entrada

A principal via de entrada são as vias aéreas superiores, a partir de secreções respiratórias de pacientes bacilíferos. 

Transmissão

A principal forma de contágio é inter-humana, sendo maior o risco de contágio, a convivência domiciliar com o doente, quanto mais íntimo o contato mais probabilidade de adquirir a doença.

·         Direta: através das vias aéreas superiores (saliva, muco nasal), contato de lesões e contato de mucosas de doentes multibacilares, pode ainda ser transmitida pelo leite materno, esperma, suor e  lágrimas.

·         Indireta: fômites contaminados pelo doente.

 

Fatores predisponentes

·         Subalimentação.

·         Viver em ambientes pouco ventilados, sem higiene e com superpopulação.

·         Miséria e pobreza.

·         Sistema de saúde ineficiente.

·         Viver em locais em que as condições sanitárias são insuficientes ou inadequadas.

·         Moléstias debilitantes.

·         Imunossupressões induzidas (transplantados).

·         Imunossupressões adquiridas (AIDS).

 

Formas clínicas

São quatro as formas clínicas da doença:

Indeterminada (I):  Caracteriza-se por mácula hipocrômica e/ou eritematosa, hipoestesicas, única ou em pequeno número, limites indefinidos, geralmente são anestésicas. Não há comprometimento de troncos nervosos, não ocorrendo por isso problemas motores ou sensitivos que possam originar incapacidades físicas. O teste de Mitsuda pode dá positivo ou negativo. A baciloscopia é negativa. 

Virchowiana (VVs e VV):  Caracteriza-se por máculas hipocrômicas, hipoestésicas com limites imprecisos; após um tempo essas placas se transformam em lesões sólidas nodulares, papulosas; ocorre queda de cílios e supercílios (madarose). Essas lesões cutâneas podem infeccionar e ulcerar. Comprometimento de troncos nervosos periféricos e de mucosas, com perda da sensibilidade, podendo ocorrer lesões viscerais, dermatológicas e de mucosas. Teste de Mitsuda é negativo. A baciloscopia é positiva.

Tuberculóide (Tte TTS):  Caracteriza-se por placa única ou placas pouco numerosas, eritematosas, violáceas, bordas elevadas de limites externos nítidos, edemaciadas, pigmentadas, uniformemente infiltradas, papulosas, sem pelos, ocorrendo perda de sensibilidade.  Tem preferência pela região plantar, palmar e facial  A baciloscopia é negativa.

Dimorfa (DT, DD, DV): Caracteriza-se por lesões pré-foveolares (eritematosas planas com o centro claro); lesões foveolares  (eritematosas infiltradas com centro deprimido); llimites indefinidos, bastante numerosas, eritematosas, rosea-violácea, pigmentada, polimorfas, bordas internas nítidas. Teste de Mitsuda geralmente é negativo. A baciloscopia é positiva.

 Obs: As diferenças entre os tipos são determinadas pelo tipo e extensão das lesões, presença de bacilos nas lesões, Reação de Mitsuda positiva ou negativa, evolução e contagiosidade e a  histologia das lesões cutâneas.  Em todas os tipos da hanseníase os nervos periféricos são atacados evoluindo para o comprometimento de todo o tronco nervoso, com paralisia de grupo musculares, deformidades e amiotrofias.

Sinais e sintomas

A maioria das manifestações clínicas depende do estado imunológico do indivíduo infectado.

fase inicial:

·         manchas claras, pálidas ou avermelhadas insensíveis a picada e ao calor, que podem vir combinadas com nódulos, bolhas, pápulas, ocorrendo em qualquer parte do corpo;

fase aguda:

·         entupimento constante no nariz, resultando em feridas, sangramentos súbitos e odor fétido;

·         aparecimento de caroços ou inchaços no rosto, cotovelos, orelhas e mãos;

·         redução ou ausência de sensibilidade ao calor, frio, dor ou ao tato;

·         ausência  de enrugamento da fronte;

·         parestesias;

·         neurite;

·         rinite; 

·         artralgias (dores nas articulações);

·         artrite (inflamação nas articulações);

·         madarose;

·         alopecia (queda de cabelos);

·         pele seca e descamativa;

·         lesões nos lábios, palato duro e/ou  palato mole;

·         insensibilidade, dor e cãimbras nos pés e mãos;

·         feridas, calos ou bolhas  nos pés com  pele ressecada;

·         rouquidão; 

·         manifestações nervosas;

·         acentuado espessamento do nervo grande auricular no pescoço.

 

manifestações oculares:

·         sensação de estar com areia nos olhos;

·         visão embaçada;

·         dificuldade de fechar os olhos  ou um olho está piscando mais que o normal;

·         lagoftalmo (limitação do fechamento das pálpebras);

·         comprometimento da produção de lágrimas, causando ressecamento da córnea e conjuntiva.

Obs: Se não houver tratamento, os bacilos podem atingir todas as estruturas do globo ocular, afetando desde a córnea  até a retina

Diagnóstico

·         Anamnese.

·         Exame clínico.

·         Exame físico.

·         Exame dermatológico (para avaliar formas clínicas da hanseníase).

·         Exame neurológico (para avaliar a sensibilidade e o comprometimento dos nervos periféricos).

·         Exame oftalmológico.

·         Exames laboratoriais.

·         Pesquisa da sensibilidade.

·         Pesquisa de BAAR. 

·         Prova da Histamina.

·         Exame de cultura de material coletado.

·         Teste de Mitsuda (não tem valor diagnóstico, somente prognóstico). 

·         Exame histopatológico (biopsia).

·         Prova de pilocarpina ou da acetilcolina (teste da sudorese).  O exame consiste em pincelar sobre a lesão suspeita tintura de iodo; repetir em outra área da pele normal sem suspeita, se possível simétricamente; injetar nas duas áreas intradermicamente a solução de pilocarpina em dois ou  mais pontos; enxugar imediatamente as gotículas que aparecem nos pontos de inoculação; após bem seca  pulverizar amido nas duas áreas; aguardar 5 minutos; na área da pele normal ou em lesões não hansênicas aparecerá pontos de coloração azul-escuro, resultante da combinação entre o amido e o iodo, provocada pela sudorese; na lesão hansenótica o amido não muda de coloração, por ausência de sudorese. 

Tratamento

Objetivo: Combater a doença de imediato com os medicamentos específicos, para que o doente não enfrente nenhuma complicação, nem chegue a ficar com seqüelas da doença, que, atualmente, é facilmente tratável.

·         Específico: existe tratamento medicamentoso para essa patologia. 

·         Tratamento ambulatorial caso não haja restrições.

·         Multidrogaterapia  (MDT) padronizada pela OMS.

·         Poliquimioterapia  (PQT) padronizada pela OMS.

·         Analgésicos e antiinflamatórios sob restrita prescrição médica.

·         Calor úmido.  

·         Quando a doença compromete mãos e braços, deve-se evitar carregar objetos pesados, crianças de colo, etc.,  por causa do risco de não poder agüentar o peso.

·         Quando a doença compromete pés e pernas, o paciente deve ficar em repouso, andar calçado só se for necessário.

·         Usar sempre óleos ou cremes para evitar o ressecamento da pele.

·         O paciente deve ser tratado em um ambiente tranqüilo e limpo. 

·         Tratamento cirúrgico, em alguns casos é necessário. Deve-se ter cuidados mais intensos em pacientes com hanseníase submetidos a cirurgia  pois estes têm mais  tendências a desenvolver processos inflamatórios mais intensos, como também o processo de cicatrização é muito mais lento. 

·         Tratamento oftalmológico é necessário, caso ocorra comprometimento visual.

·         No caso de reações inflamatórias intraoculares, o uso de corticóides tópicos associados a midriáticos prescritos, deve ser indicado.

·         Lubrificantes oculares tipo colírios ajudam no ressecamento.

·         No caso de lesões oculares, o oftalmologista deve acompanhar o paciente, por pelo menos cinco anos após a sua saída do registro ativo.

·         Medidas fisioterapêuticas podem ser necessárias.

·         Suporte psicológico: porque sendo uma doença que pode chegar ao ponto de causar deformidades e alterações degenerativas  irreversíveis, o temor, a vergonha e o estigma, podem afetar também o psicossocial do doente.

·         O paciente deve ser informado sobre os efeitos colaterais  das medicações e, se ocorrer esses efeitos, deve comunicar ao médico imediatamente.

O tratamento será 100% eficiente se for feito corretamente do início até o fim. Na primeira dose do tratamento 99% dos bacilos são eliminados, sem o risco de contaminação nem transmissão, sendo que o paciente que está em tratamento não transmite a doença.  Se a doença atingir outros familiares do domicílio, provavelmente, eles já foram contaminados, antes do início do tratamento do doente.

Obs: No Brasil, o tratamento é gratuito, através do Sistema Único de Saúde (SUS). O paciente só necessita se cadastrar nos postos de saúde ou hospitais conveniados, para ter acesso.

Abandono do tratamento:  O tratamento da Hanseníase dura, em média, de seis a 12 meses. Mas, apesar da gratuidade do tratamento, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o índice de abandono dos que iniciam o tratamento é um fator preocupante. A interrupção do tratamento pode contribuir negativamente para as complicações   e  as seqüelas da doença. Além de dificultar a cura, essa interrupção do tratamento pode resultar em inflamações de pele e de nervos que podem se tornar incapacitantes e, interferir consideravelmente, na qualidade de vida do portador.

Complicações

Atualmente, as complicações são decorrentes do abandono do tratamento, ou quando o portador não procurou atendimento médico na fase inicial da doença, ou quando a Hanseníase não foi diagnosticada corretamente. 

·         Eritema nodoso hansênico.

·         Sequelas neuromusculares.

·         Osteoporose.

·         Mutilações e amputações de extremidades.

·         Deformidade  e alterações degenerativas irreversíveis.

·         Osteomielite.

·         Afrouxamento ou perda dos dentes incisivos superiores.

·         Glomerulonefrite.

·         Glaucoma e cegueira.

 

Seqüelas

Geralmente, as seqüelas da Hanseníase são irreversíveis.

·         Diminuição da fertilidade masculina.

·         Ginecomastia.

·         Garra fixa de dedos e artelhos.

·         Desabamento do nariz (comprometimento do arcabouço cartilaginoso do nariz e, conseqüente, alteração de sua forma).

·         Áreas anestésicas.

·         Mutilações dos membros inferiores.

·         Marcha escarvante.

·         Nos membros superiores pode ocorrer mão em garra, mão pendular ou mão simiesca.

·         Comprometimento da laringe (rouquidão, alteração da voz ou dificuldade de respirar por lesão da glote).

·         Paralisia facial.

·         Úlceras e lesões.

·         Lagoftalmia (impossibilidade de fechar o olho por paralisia da pálpebra, quase sempre a inferior).

·         Cegueira.

·         Cicatrizes.

·         Mal perfurante plantar.

·         Incapacidade física.

·         Madarose.

·         Reabsorção óssea.

Profilaxia

Medidas sanitárias:

·         Notificação Obrigatória às Autoridades Sanitárias.

·         Se o tratamento é ambulatorial, deve seguir as medidas de prevenção para não ocorrer contaminação nos interdomiciliares.

·         Educação Sanitária ao público.

·         Campanhas preventivas para diagnóstico precoce.

·         Vigilância dos comunicantes intradomiciliares.

·         Vacinação dos intradomiciliares com vacina BCG intradérmica, como forma de prevenção.

 

Medidas individuais:

·         Cuidados para prevenir deformidades físicas.

·         Cuidados básicos de higiene pessoal.

·         Prevenção das deformidades físicas através de calçados especiais, palmilhas, aparelhos dorsiflexores.

·         Qualquer mancha ou alguma lesão suspeita ou que perde a sensibilidade deve ser investigada pelo médico.

·         No caso de comprometimento ocular usar óculos protetores para prevenir a ação de corpos estranhos.

·         Lubrificantes oculares minimizam as conseqüências do ressecamento e da exposição. 

Obs: O diagnóstico precoce juntamente com o tratamento, é o meio mais seguro de combater a Hanseníase, que é uma doença facilmente tratável, logo que aparece a mancha característica na pele.


Dúvidas de expressões e termos médicos  consulte o Glossário geral.