DOENÇA DE CHAGAS CONGÊNITA
Definição
Doença infecciosa parasitária crônica e generalizada, transmitida ao homem por um protozoário que é encontrado nas fezes do barbeiro. Quando a gestante se infecta ela pode transmitir pelo sangue, a doença para o feto. O RN pode adquirir a doença por transfusão de sangue contaminado ou também pela amamentação.
Quando a doença afeta a criança na primeira infância o prognóstico é mais reservado, porque a criança pode sofrer um ataque agudo do coração como também pode acarretar alterações no sistema nervoso. A doença é uma das principais causas de patologias cardíacas em crianças nas zonas rurais endêmicas do Brasil.
Agente etiológico
Protozoário Trypanosoma cruzi; da ordem dos Kinetoplastida; família dos Trypanossomatídeo; do gênero Trypanosoma; classe Mastigophora.
Patogênese
A transmissão materna ocorre com a penetração de formas tripomastigotas através do epitélio trofoblástico, das vilosidades coriais, dos troncos vilositários e/ ou da placa corial. A vilosite é secundária à ruptura dos macrófagos parasitados. No feto e no recém-nascido, as lesões observadas são de um modo geral, semelhantes às da fase aguda não congênita e estão diretamente relacionadas ao parasitismo dos tecidos.
Contudo, têm sido registradas no período neonatal, manifestações neurológicas e digestivas, tais como megaesôfago e retardo mental, que eram descritas apenas na forma crônica da doença não congênita, ocorrendo muitos anos após o início da infecção. Estas manifestações são consideradas como seqüelas do processo inflamatório agudo. Certamente ocorrem mais precocemente na forma congênita devido à ação lesiva do parasito num organismo ainda com seu sistema imunológico imaturo.
Grupo de risco para infecção chagásica congênita
Infecção chagásica congênita:
Recém-nascidos prematuros, pequenos para a idade estacional ou com quadro clínico de infecção congênita, filhos de mulheres procedentes ou residentes em área endêmica para doença de Chagas e/ ou hemotransfundidas no passado, mesmo que assintomáticas.
Filhos de mulheres com infecção chagásica, inclusive as assintomáticas.
Infecção chagásica adquirida:
Crianças amamentadas em mãe chagásica..
Recém-nascidos que tiveram contato com triatomíneos (barbeiros).
Recém-nascidos que receberam transfusão de sangue ou de hemoderivados.
Transmissão
A transmissão congênita da Doença de Chagas ocorre, principalmente, por via hematogênica através da placenta (via transplacentária). Pode também haver transmissão hematogênica através das membranas extraplacentárias, com posterior contaminação do líquido amniótico.
Transmissão lactogênica já foi diagnosticada, por isso, nesse caso mães infectadas não podem amamentar.
Transmissão por transfusão de sangue é rara, mas pode ocorrer, caso o RN, necessite de hemotransfusão.
Transmissão por transplante de órgãos, é considerado caso raro.
Transmissão pelo vetor, que pode picar o RN, no berço.
Obs: Nos casos de transmissão lactogênica, transfusional e pelo vetor, a doença de Chagas é considerada uma infecção não congênita e sim adquirida.
Manifestações clínicas
Gestante: A maioria das gestantes chagásicas também é assintomática e encontra-se nas fases indeterminada ou assintomática das formas cardíaca e digestiva. Cerca de 50% delas encontram-se na fase indeterminada. Outras, mesmo sem sintomas, apresentam alterações detectáveis aos exames eletrocardiográfico convencional e radiológico do trato digestivo. Nas gestantes chagásicas sintomáticas, as manifestações cardíacas são relacionadas aos distúrbios de condução ou à insuficiência miocárdica. As alterações digestivas são decorrentes do megaesôfago e/ ou megacólon.
Recém-nascido: Os órgãos mais envolvidos na doença de Chagas congênita são o coração, o sistema nervoso central, o trato digestivo, a pele, o músculo esquelético e os pulmões. As manifestações clínicas podem estar presentes ao nascimento ou aparecer posteriormente, mas quando essas manifestações aparecem posteriormente fica difícil de saber se é uma infecção congênita ou adquirida.
prematuridade;
pequenos para a idade gestacional;
peso diminuído para a idade gestacional, nos RN nascido a termo;
anemia é freqüente, e em alguns casos, pode ser tão severa que pode necessitar de transfusão de sangue;
cianose;
icterícia, que geralmente desaparece em torna da 3ª semana de vida;
lesões cutâneas: podem aparecer sob a forma de petéquias ou equimoses;
edema de genitália
edema de membros;
tremores;
convulsões;
meningoencefalite chagásica;
presença de calcificações intracranianas;
hepatomegalia;
esplenomegalia;
megacólon chagásico congênito;
megaesôfago chagásico congênito;
regurgitações;
vômitos;
dificuldade de ingestão de leite, devido a comprometimento digestivo;
lesões oculares: edema de pupila, hemorragia da retina, coriorretinite, lesões maculares e opacificação do corpo vítreo;
alterações cardíacas: taquicardia, bradicardia, sopro sistólico;
alterações ósseas principalmente em ossos longos.
A parasitemia nos primeiros dias de vida pode não ser tão evidente nos exames laboratoriais. No entretanto, a parasitemia eleva-se progressivamente, alcançando o pico máximo quando a criança tem um a dois meses de idade, declinando depois lentamente durante um período de cinco a oito meses.
O aumento do fígado (hepatomegalia) e do baço (esplenomegalia) constitui um dos principais sinais desta enfermidade. Geralmente presente ao nascer, a hepatomegalia aparece primeiro que a esplenomegalia e persiste durante vários meses, mesmo após a recuperação clínica, tendo resolução mais lenta que a esplenomegalia.
Manifestações clínicas que ao nascer indicam um mau prognóstico são acentuados baixo de peso e hepatoesplenomegalia, tendência hemorrágica, meningoencefalite e associações com outras infecções. Parasitemias superiores a 10 tripanossomas por mm3, depois do terceiro dia de vida, podem infelizmente indicar uma evolução gravíssima e em alguns casos levar o RN ao óbito, mesmo com tratamento intensivo.
Diagnóstico
Anamnese e exames laboratoriais da mãe para detectar a doença materna.
Exame físico logo após o nascimento.
Quadro clínico.
Exames neurológicos.
Exames laboratoriais.
Testes sorológicos (pesquisas de anticorpos IgM específicos contra os parasitas).
Coleta imediata do sangue do cordão para testes.
Exames parasitológicos.
ECG para detectar anormalidades cardíacas.
RX do crânio pode detectar calcificações cranianas.
TCE - para detecção de lesões cerebrais.
USG - Ultrassonografia.
Diagnóstico diferencial
O diagnóstico diferencial deve ser feito em relação a outras doenças congênitas que apresentam quadros clínicos viscerais e neurológicos semelhantes à Doença de Chagas.
Infecção pelo Citomegalovírus.
Rubéola congênita.
Toxoplasmose congênita.
Sífilis congênita.
Doença hemolítica perinatal.
Tratamento
Objetivo é interferir no curso da doença, encurtando a fase aguda, fazendo desaparecer a sintomatologia e até mesmo promovendo uma possível cura da infecção, com os exames parasitológicos e sorológicos negativados.
O tratamento das mulheres sorologicamente positivas e em idade fértil, no sentido de diminuir ou suprimir a parasitemia e evitar a transmissão, não é uma atitude recomendável, porque não se conhece ainda todo o efeito destas drogas no embrião e no feto. Se, contudo, a gestante estiver na fase aguda da doença, justifica-se o tratamento, devido ao risco materno, mas a mãe deve ser informada sobre a gravidade de sua doença e sobre os possíveis efeitos lesivos do tratamento sobre o feto, cabendo a ela tomas uma decisão.
Existe tratamento medicamentoso específico para a doença.
O tratamento deve ser feito em ambiente hospitalar, o RN deve ficar internado, mas caso as lesões sejam graves, o RN deve ser assistido em uma UTI neonatal para melhor monitoramento.
A criança deve ser preferencialmente acompanhada pelo menos até os 12 anos de idade. A Doença de Chagas é uma doença lenta e geralmente nesse período entre os 10 e 12 anos é que alguns sintomas cardíacos começam a ser evidenciados. Mesmo que os exames parasitológicos e sorológicos sejam negativos, não custar pelo menos duas vezes ao ano fazer uma consulta específica ao médico, para tentar detectar precocemente qualquer anomalia.
Obs: A evolução da criança com infecção congênita depende do estado geral em que se encontra, da intensidade da parasitemia e das medidas terapêuticas empregadas. Os recém-nascidos a termo, têm sempre melhor prognóstico, principalmente quando nascem sem sintomatologia.
Prognóstico: Quando a sintomatologia está presente ao nascer, a mortalidade é de cerca de 50%, entre prematuros pode elevar-se até 70%. Crianças assintomáticas ao nascer podem posteriormente, manifestar alterações compatíveis com a fase crônica da doença, sendo que algumas dessas alterações, principalmente quando envolvem o coração, em alguns casos são irreversíveis.
Complicações
Meningoencefalite.
Distúrbios gastrointestinais devido ao Megacolón e Megaesôfago.
Taquicardia.
Alterações cardíacas.
Desnutrição.
Pneumonia.
Obstipação crônica.
Sequelas
Insuficiência cardíaca na fase crônica da doença geralmente na idade entre 7 e 10 anos, pode se desenvolver.
Sopro sistólico.
Aumento do volume do coração e outras alterações cardíacas, geralmente após os 12 anos de idade, essas alterações ocorrem quase sempre em crianças que nasceram com a doença mas sem evidência de manifestações clínicas (assintomáticas). Após a primeira década de vida, os sintomas da doença infelizmente começam a se manifestar, com a sintomatologia parecida com a fase crônica do adulto.
Deficiência mental.
Distúrbios de conduta.
Distúrbios de aprendizado.
Paralisia cerebral, em casos raros em que não houve tratamento.
Cegueira.
Lesões ósseas.
Infecção não congênita no recém-nascido e lactente
Após o nascimento, a infecção pode ser adquirida através do vetor, da hemotransfusão ou pela amamentação.
Na infecção adquirida por hemotransfusão, os aspectos clínicos são diferentes da infecção adquirida através do vetor porque o período de incubação é maior e não há sinais de porta de entrada. Como o recém-nascido que recebe transfusões é portador, na maioria das vezes, de infecção ou doença hemolítica perinatal, ao desenvolver a fase aguda da doença de Chagas, o seu quadro clínico pode-se confundir com o agravamento da doença prévia. Este deve ser o motivo pelo qual poucos casos têm sido registrados de Doença de Chagas adquirida por transfusões efetuadas nos primeiros meses de vida, sendo a expectativa da ocorrência muito grande, devido ao indiscriminado uso de hemotransfusões, principalmente em prematuros.
Na infecção adquirida pela amamentação, essa já foi comprovada em mães que amamentavam seus bebês na fase aguda da doença. Por isso recomenda-se que mulheres com a Doença de Chagas comprovada por exames não deve amamentar seus bebês, nem fornecer leite para Banco de leite.
Na infecção adquirida através do vetor, os pais devem usar de todas as medidas preventivas, para que sua casa não tenha barbeiros.
Prevenção
O combate aos barbeiros e a melhoria das condições de vida da população são fatores que podem diminuir a possibilidade de infecção materna, contribuindo assim a longo prazo, para a prevenção da infecção congênita pelo T.cruzi.
A mulher na fase aguda da doença, antes de negativar sua parasitemia pelo tratamento, não deve amamentar.
A mulher chagásica em qualquer fase da doença, não deve ser doadora de leite materno, nem deve jamais fornecer leite materno para "Banco de leite".
Bancos de Sangue devem fazer seleção rigorosa de doadores de sangue através da realização de pelo menos duas reações sorológicas, o que aumenta a margem de segurança.
Deve ser recomendado à mulher que reside em casa infestada por barbeiros que proteja o seu recém-nascido de modo adequado. O colchão não deve conter insetos e este deve ser revestido de plástico. O cortinado deve ficar bem preso ao colchão e suficientemente afastado da criança para que os barbeiros sobre o cortinado não consigam picar o bebê. No entanto, o combate à infecção pelo vetor depende, principalmente da conscientização da família e da comunidade.
Dúvidas de termos técnicos, consulte o Glossário geral.
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